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Relator no STF vota pelo referendo de medidas de combate à epidemia da Covid-19 entre indígenas

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Foto: internet

Para o ministro Barroso, o objetivo do deferimento da liminar é salvar o maior número de vítimas possível, preservando etnias, e abrir o diálogo entre as partes envolvidas.

O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta segunda-feira (3) o julgamento de referendo de medida cautelar em que o ministro Luís Roberto Barroso, relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, determinou ao governo federal a adoção de medidas para conter o avanço da Covid-19 nas comunidades indígenas. Na sessão extraordinária de abertura dos julgamentos do segundo semestre, ele votou pela confirmação da liminar deferida. O julgamento deve ser retomado na próxima quarta-feira (5).

A ADPF foi apresentada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, em conjunto com seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede, PT, PDT). Eles apontam que as falhas e as omissões do governo federal e o alto risco de contágio do coronavírus podem resultar no extermínio de etnias. Em julho, o ministro Barroso determinou a adoção de diversas medidas, como sala de situação, barreiras sanitárias, plano de enfrentamento da Covid-19, contenção de invasores e acessibilidade à saúde própria ou diferenciada para indígenas aldeados e não aldeados, estes na falta de vagas no Sistema Único de Saúde (SUS).

Genocídio

Em nome da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Luiz Henrique Eloy Amado ressaltou que a proteção dos povos indígenas é um compromisso do Estado brasileiro que não pode ser mitigado. Com base em dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, afirmou que, durante a pandemia, 623 indígenas morreram, 21.646 foram infectados e 146 povos foram atingidos no Amazonas, no Pará, em Mato Grosso, em Roraima e no Maranhão.

Pelo Partido Socialista Brasileira (PSB) e pela Rede Sustentabilidade, Daniel Sarmento destacou que, pela primeira vez, os indígenas reivindicam, em nome próprio, a defesa dos seus direitos no âmbito da jurisdição constitucional. Ele afirmou que o julgamento também é histórico porque pode prevenir um genocídio decorrente do risco sanitário representado pelas invasões.

Representando o Partido Democrático Trabalhista (PDT), Lucas de Castro Rivas salientou que a retirada dos invasores é medida de saúde pública das populações indígenas, e não de política agrária.

Segundo o advogado do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Paulo Machado Guimarães, a contaminação de Covid-19 entre os indígenas é maior do que a média nacional brasileira, com letalidade de cerca de 9,6%, enquanto que na população brasileira é de 5,6%. “Só esse número é suficiente para fazer com que as medidas concedidas sejam referendadas”, disse.

Sobrevivência física e cultural

Gustavo Zortéa da Silva, da Defensoria Pública da União (DPU), afirmou que a questão abriu espaços de diálogos interculturais. Juliana de Paula Batista, do Instituto Socioambiental (ISA), defendeu que o STF reafirme a proteção jurídica das terras indígenas, independentemente de sua demarcação, e salientou que a contaminação dos indígenas pode custar sua sobrevivência física e cultural.

Pela Comissão Guarani Yvyrupa, Gabriela Araújo Pires traçou um breve panorama da situação e ressaltou a vulnerabilidade das comunidades indígenas, em razão da ausência de saneamento básico e médicos. Em nome da Terra de Direitos e do Conselho Indígena Tapajós Arapiun, Pedro Sérgio Vieira Martins contou que mais de 500 indígenas contaminados no baixo Tapajós não têm acesso a condições melhores de saúde, mas observou que a existência de um polo de saúde indígena em Santarém (PA) representa um grande avanço. Representando a Conectas Direitos Humanos e a Associação Direitos Humanos em Rede, Júlia Mello Neiva solicitou a confirmação das medidas cautelares e lembrou que o Estado brasileiro tem o dever de proteger as comunidades indígenas.

Ações do governo

O advogado-geral da União (AGU), José Levi do Amaral, relatou ações do Estado por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) para o cumprimento das medidas. Segundo ele, a União está empenhada em debater as políticas públicas que já estão em curso e buscar novas soluções. Para Levi, os dados apresentados nos autos comprovam também a atuação do Ministério da Defesa em todo o território nacional em favor dos indígenas. “O desafio colocado é de grande envergadura e sempre estará em contínuo melhoramento”, afirmou, ao destacar que “vidas humanas importam”. O procurador-geral da República, Augusto Aras, também se manifestou de forma favorável ao referendo da medida cautelar.

Diálogo

Ao votar pelo referendo da medida cautelar, o ministro Barroso afirmou que a questão envolve o direito à vida e à saúde e o direito de comunidades indígenas viverem de acordo com suas tradições. Ele ressaltou que cabe a elas apresentar reivindicações e ao governo indicar possibilidades e limites para sua atuação. Segundo o relator, a concessão da cautelar se deu com base em três premissas: o princípio da prevenção ou precaução (para salvar o maior número de vítimas possível e preservar as etnias) e a abertura de um diálogo institucional (entre o Poder Judiciário e o Poder Executivo) e intercultural (entre não indígenas e as comunidades indígenas, cada uma com suas particularidades e tradições próprias).

Retirada dos invasores

Para Barroso, a retirada dos invasores das terras indígenas é a questão mais difícil, mas é medida imprescindível. “É inaceitável a inação do governo – talvez de todos até aqui, em alguma medida – em relação à invasão das terras indígenas, ainda mais em razão do grave risco que representa para a prática de crimes ambientais”, afirmou, ao se referir a desmatamentos, queimadas, extração ilegal de madeira, degradação da floresta, extinção das espécies e outras consequências. “Não reprimir esses crimes é gravíssimo”.

Na avaliação do ministro, a remoção de invasores é imperativa. Entretanto, observou que a situação não é nova. “Não há como equacionar esse problema nos limites de uma medida cautelar”, assinalou. “É preciso um plano, e a União deve se organizar para enfrentar o tema”. Barroso lembrou que a aproximação de pessoas poderia agravar a ameaça já existente pela Covid-19.

Cordão sanitário

O ministro ponderou que a retirada de 20 mil invasores localizados em sete comunidades poderia ensejar uma verdadeira guerra armada. Por esse motivo, considerou como medida emergencial de contenção aos invasores a criação de um cordão sanitário, com a atuação indispensável das Forças Armadas, e a elaboração de um plano de desintrusão (efetivação da posse da terra a um povo indígena). “A União deve conceber a desintrusão com recursos e cronogramas próprios”, concluiu.

Fonte: STF

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